quarta-feira, 7 de março de 2018

Boulos, o PSol e o fio da navalha

Cid Benjamin *


O PT não vai desaparecer, mas - assim como o atual PMDB é uma caricatura do MDB dos anos da ditadura - tornou-se uma caricatura do que já foi. Ficou parecido com os partidos que, na sua origem, criticava. Poucos acreditam que possa ser ainda instrumento na luta pelas reformas estruturais que um dia defendeu. Seu projeto original morreu. Seu esforço parece se concentrar na defesa dos dirigentes ameaçados de prisão, em especial Lula.



Hoje já não temos a conjuntura que, com Lula e Dilma, permitiu melhorar a vida dos mais pobres sem afetar os interesses dos ricos. O quadro mudou. Agora, para melhorar a situação dos de baixo é preciso contrariar interesses dos poderosos. A governabilidade não pode mais depender de alianças com a escória da política, como fez o PT. É preciso a politização dos trabalhadores, buscando neles apoio a medidas que beneficiem a maioria e que, se tomadas, enfrentarão resistência dos mais ricos.



A compreensão de que é preciso políticas mais radicais – o que não significa sectárias – está na origem da confluência do PSol com Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), fazendo dele o provável candidato do partido a presidente.



Estamos num momento propício para a reorganização da esquerda e a semeadura de um novo ciclo. A cada quatro anos, nas eleições presidenciais, o país discute projetos nacionais. O PSol quer aproveitar o momento, buscando ocupar o espaço aberto com o fim do ciclo PT como partido de transformações sociais.



Esse espaço aumenta se Lula, vítima de perseguição judicial, não for candidato – o cenário mais provável. Com ele na disputa seria mais difícil a atração das bases do PT, essenciais para o novo projeto de esquerda alcançar setores populares mais amplos.



Ainda assim, a tarefa a que se propõem o PSol e Boulos não é simples.



A candidatura só tem sentido se aparecer como diferente da experiência petista. Mesmo que o alvo principal sejam o governo Michel Temer e os candidatos da direita (e aqui não me refiro apenas ao caricatural Bolsonaro, mas também aos demais que têm se autoclassificado como “de centro”), a candidatura Boulos só se justifica se demarcar campos com Lula e o PT. Não sendo assim, não sensibilizaria a multidão de descontentes com a política e com os petistas. E, se for semelhante a Lula e ao PT, por que existir?





Por outro lado há o temor de que ataques mais duros do PSol acabem afastando o eleitorado órfão do lulismo, alvo da tentativa de atração.



É nessa corda bamba que a candidatura vai caminhar.



Exemplo dela ocorreu no pré-lançamento organizado por Boulos no último dia 3, antes mesmo de se filiar ao PSol. Foi exibido um vídeo de Lula saudando a candidatura e dispondo-se a subir em seu palanque. Certamente, isso ajuda a atrair a base lulista. Mas, para alguns, a fala deu a impressão de que Boulos seria não um adversário, mas uma espécie de linha auxiliar do PT. Afinal – dizem estes – se é fato que o vídeo ajuda a sensibilizar bases lulistas, desidrata Boulos como alternativa, neutralizando seu viés crítico. Com isso, ajuda os que hoje são mais fortes. E, apesar de tudo, Lula e o PT ainda são eleitoralmente maiores.



Assim, embora o jogo jogado pelo PSol pareça o melhor para ele, é arriscado. E, como dizia o falecido treinador da seleção portuguesa Oto Glória: “Quando o time ganha, o técnico é bestial (que, na terrinha, significa genial); quando o time perde, ele é uma besta”.



Nesse fio de navalha caminham Boulos e o PSol.



*Jornalista

Jornal do Brasil 


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